Quando o pai desapareceu, sua mãe não demonstrou nenhuma surpresa ou mágoa violenta, porém uma repentina mudança a acometeu. Parecia ter perdido a fibra. Era evidente, até para Winston, que ela esperava algo que deveria acontecer. Fazia todo o necessário - cozinhava, lavava, remendava, fazia a cama, varria, espanava - sempre muito devagar e com uma curiosa economia de gestos supérfluos, como uma figura criada por um artista e que se movesse por si mesma. O corpo grande e bem proporcionado pareceu cair num marasmo natural. Durante horas a fio ficava sentada quase imóvel na cama, cuidando da filhinha, uma criança miúda, enfermiça, muito calada, de dois ou três anos, e a quem a magreza dera feições de símio. De raro em raro, tomava Winston nos braços e apertava-o contra o seio longo tempo, sem dizer nada. E ele percebia, apesar da pouca idade e do seu egoísmo, que esta atitude era ligada a uma coisa imencionável que não tardaria a ocorrer.