1984 - Cap. 16: Capítulo XVI Pág. 173 / 309

Capítulo XVI

Haviam resolvido, por fim se haviam resolvido! A sala em que estavam era comprida e suavemente iluminada. A teletela fora reduzida a um murmúrio; a maciez e espessura do tapete azul dava a impressão de se andar no veludo. No extremo da sala, O'Brien estava sentado a uma mesa, sob uma lâmpada de abajur verde, com um monte de papéis de cada lado. Nem se dignara levantar o olhar quando o criado introduziu Júlia e Winston.

O coração de Winston batia com tanta força que duvidava poder falar. Haviam resolvido, haviam-se resolvido afinal, era tudo que conseguia pensar. Fora ousadia ir à casa de O'Brien, e pura loucura chegar à sua porta com Júlia; embora fosse verdade que tivessem ido por caminhos diferentes apenas se encontrando diante da porta. Mas era preciso muita coragem e esforço nervoso para entrar num lugar desses. Só em ocasiões muito raras se viam por dentro as residências do Partido Interno, ou se visitava o bairro em que moravam os chefes. Toda a atmosfera do enorme edifício de apartamentos, a riqueza e a vastidão de tudo, os cheiros fora do comum de boa comida e bom fumo, os elevadores silenciosos e incrivelmente rápidos, disparando para cima e para baixo, os criados de jaqueta branca, sempre apressados - era tudo intimidante. Embora Winston tivesse um bom pretexto de ali estar, a cada passo assombrava-o o medo de que um guarda de farda negra aparecesse de repente, ao dobrar uma esquina, exigisse seus papéis e o mandasse embora. O criado de O'Brien, porém, admitira os dois sem titubear. Era um homenzinho de cabelo escuro, paletó branco, cara losangular, inteiramente sem expressão, e que poderia passar por chinês. O corredor pelo qual os guiou era atapetado, e tinha paredes creme, com rodapé branco, tudo imaculadamente limpo.





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