Eurico, o Presbítero - Cap. 17: Capítulo 17 Pág. 156 / 186

Entre os cavaleiros a quem Pelágio dirigira aquelas palavras houve alguns instantes de hesitação, e um murmúrio de descontentamento; mas, por fim, Sanción, pegando em um dos fachos, encaminhou- se para a escada subterrânea, e os outros seguiram-no. Os quase selvagens filhos do Munda, vestidos de peles de alimárias, e os cântabros, cujas feições e trajes também revelavam a sua origem céltica, não tardaram a entrar na caverna. Pelágio então lhes ordenou obedecessem aos guerreiros que os haviam precedido, e em breve o som das passadas daquele tropel desordenado, alongando-se pelo abismo, morreu em silêncio total.

Eurico parecia indiferente ao que se passava ao pé dele, assentado no escabelo e com os olhos cravados no cepo candente que se consumia no afumado lar. Pelágio voltou-se para ele, e disse-lhe:

— Vós, Eurico, ficareis aqui: vós que salvastes minha irmã, sereis o seu guardador. Quem melhor vigiaria por Hermengarda do que esse homem que nela tem um testemunho perene do mais indizível esforço, da mais pura e generosa lealdade? Desejaria ver junto de mim no combate o melhor guerreiro de Espanha: ter-vo-lo-ia, até, pedido quando o mistério em que vos envolvíeis nos fazia suspeitar a todos que vós, o cavaleiro negro, éreis um ente privilegiado e não um mortal como nós. Agora, porém, depois que no transe horroroso das margens do Sália nos revelastes quem sois; quando, resolvido a morrer, pedíeis apenas algumas lágrimas para a vossa memória àqueles que vos sobreviviam, pedir-vos-ei eu, também, que não queirais encontrar o primeiro ímpeto dos sarracenos. Se na defensão desta nossa triste morada, aonde cumpre atraí-los, for necessário o auxílio do vencedor dos Vascónios, do mais ilustre dos tiufados de Vitiza, ou se a cólera de Deus ainda não está satisfeita, e devem hoje perecer os últimos homens livres da Espanha, vireis vós morrer connosco. Entretanto, continuai a ser o anjo da guarda da pobre filha de Fávila. Ela parece mais tranquila, e o monge Baquiário, em cuja ciência têm achado alívio tantos de nossos irmãos, recomendou o repouso como o melhor remédio para a febre que a devora. Retardarei quanto puder o instante de se acolherem aqui as mulheres, as crianças e os velhos inúteis para o combate. Fazei, entretanto, que nestes lugares reine profundo silêncio.





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