Robinson Crusoe - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 36 / 241

E achando-se já equipado o buque, feito o carregamento e bem arrumados os assuntos pelos meus sócios, embarquei, em má hora, no primeiro de Setembro de 1659, aniversário fatal do dia em que, rebelde às ordens da família e desconhecendo os meus próprios interesses, tinha abandonado Hull oito anos antes.

O nosso barco era de umas 120 toneladas de carga, levava seis canhões e catorze homens, além do comandante, do seu grumete e de mim. Não tínhamos a bordo muita carga de mercadorias, mas apenas as bugigangas necessárias para negociar com os negros, tais como contas de colar, bocados de vidro, conchas e velhas ninharias, especialmente espelhos pequenos, facas, tesouras, machados, etc.

Mal saltei para bordo, fizemo-nos à vela, tomando rumo norte, com a intenção de navegar para a costa de Africa quando chegássemos aos 10 ou 12 graus de latitude norte, que era a rota vulgar que naquele tempo se fazia. Ao longo de toda a costa tivemos bom tempo; apenas o sol era ardente e sufocante. Por alturas do cabo Santo Agostinho penetrámos no alto mar tomando a direcção como se tivéssemos querido alcançar a ilha Fernando de Noronha; mas a nossa rota para NE fez-nos deixar aquela ilha para leste. Após doze dias de navegação encontrávamo-nos em 7° 22' de latitude norte quando uma tempestade violenta nos arrojou de súbito para fora da rota. O vento soprou a princípio de sudeste. Voltou em seguida para noroeste, fixando-se, por fim, em nordeste, e chegou a ser tão violento que durante doze dias completos não pudemos fazer outra coisa do que seguir à deriva, deixando-nos levar pelo vento e entregues à sorte que a sua fúria nos destinasse. Minuto a minuto julgava que o mar ia fazer-nos desaparecer, e ninguém tinha esperanças de escapar daquele perigo.

Ao terror que a tempestade nos causou, juntou-se a dor de termos de lançar à água um dos nossos homens, que morreu de febres ardentes, e de um marinheiro e o grumete terem sido arrastados por uma onda. Ao fim dos doze dias o vento acalmou, e o comandante procurou reconhecer a situação em que nos encontrávamos.