1984 - Cap. 21: Capítulo XXI Pág. 284 / 309

Capítulo XXI

Estava muito melhor. Engordava e ficava mais forte cada dia, se é que podia falar de dias.

A luz branca e o zumbido eram os mesmos de sempre, porém a cela era um pouco mais confortável que as outras em que estivera. Havia um travesseiro e um colchão na cama de tábua, e lhe permitiam lavar-se com certa frequência na bacia de folha. Até lhe davam água morna para se lavar. Haviam fornecido roupa de baixo nova e um macacão limpo. Tinham pensado a úlcera com uma pomada. Haviam tirado os restos dos dentes e lhe dado um jogo de dentaduras.

Deviam ter passado semanas ou meses. Agora seria possível marcar a passagem do tempo, se tivesse interesse em fazê-lo, pois alimentavam-no a intervalos aparentemente regulares. Acreditava que lhe davam três refeições cada vinte e quatro horas; às vezes, raciocinava vagamente se as recebia de dia ou de noite. A comida era surpreendentemente boa, com carne de três em três refeições. Certa vez veio até um maço de cigarros. Não tinha fósforos, porém o guarda mudo que lhe trazia a comida dava-lhe fogo. Da primeira vez que tentou fumar enjoou muito, porém perseverou, e fez o maço durar muito tempo, fumando meio-cigarro após a refeição.

Haviam-lhe dado uma ardósia branca, com um toco de lápis amarrado à moldura. A princípio não a usou. Mesmo quando desperto sentia-se completamente entorpecido. Muitas vezes deixava-se ficar na cama de uma refeição à outra, quase sem se mexer, ora dormindo, ora mergulhado em vagas elucubrações durante as quais não valia a pena abrir os olhos. Havia muito que se acostumara a dormir com a luz forte no rosto. Parecia não fazer diferença. À exceção dos sonhos, que se tornavam mais coerentes.





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