Aplicou um pontapé no rijo posterior de Stevenson. Arte aí, velho péni falso? És carne fria, se jamais algum escocês o foi.
Ping! A sineta da loja. Gordon deu meia volta. Duas clientes, para a livraria.
Uma mulher deprimida, de ombros arredondados da classe baixa, que parecia um pato sujo enfiando o bico entre o lixo, transpôs ai entrada, com uma cesta de vime na mão. Na sua esteira, movia-se outra que lembrava uma pequena ave, de faces vermelhas, da classe média, com um exemplar de A Femilie Forsyte debaixo do braço - o título voltado para fora, para que os transeuntes com os quais se cruzasse vissem que se tratava de uma intelectual.
Gordon suprimiu a expressão de amargura e saudou-as com a cordialidade discreta de médico de família reservada para os subscritores da livraria.
- Boa tarde, Mrs. Weaver. Boa tarde, Mrs. Penn.
Que tempo horrível!
- Péssimo! - confirmou Mrs. Penn.
Ele desviou-se para que passassem. Mrs. Weaver inclinou o cesto de vime e deixou cair no chão um exemplar assaz usado de Bodas de Prata, de Ethel M. Dell. Os olhos brilhantes de pássaro de Mrs. Penn cravaram-se-lhe com um clarão. Atrás das costas da outra, sorriu a Gordon, maliciosamente, de um intelectual para outro. Dell! Que, baixeza! Os livros que as classes inferiores liam! Ele retribuiu o sorriso compreensivamente e passaram à biblioteca, dois intelectuais sorridentes.
Mrs. Penn pousou A Família Forsyte na mesa e volveu o seu busto de ave para Gordon. Mostrava-se sempre muito afável para com ele. Tratava-o por Mister Comstock, apesar de ser um mero empregado de livraria, e trocavam impressões sobre literatura. Havia a franco-maçonaria intelectual entre ambos.
- Espero que gostasse de A Família Forsyte, Mrs. Penn.
- O livro é um achado perfeitamente maravilhoso, Mr. Comstock! Sabe que, com esta, é a quarta vez que o leio? Uma obra épica, uma autêntica epopeia!
Mrs. Weaver espreitava entre os livros, demasiado obtusa para compreender que se achavam por ordem alfabética.