Gordon afastou-se um pouco dele, as mãos enfiadas nos bolsos, com uma expressão sombria. Na realidade, previra tudo aquilo e sabia que devia recusar, queria recusar, mas faltava-lhe a coragem.
- Não tenciono sugá-lo a esse ponto - acabou por replicar, amuado.
- Evite expressões como essa entre nós, por favor.
Aliás, para onde iria, se não ficasse aqui?
- Não sei. Provavelmente, dormia na valeta. É o meu lugar apropriado. Quanto mais depressa for para lá melhor.
- Histórias! Continuará aqui até aparecer outro emprego.
- Mas não há empregos disponíveis. Pode passar um ano primeiro que apareça alguma coisa. Não quero empregar-me.
- Não deve falar assim. Estou convencido de que encontrará trabalho. E, por amor de Deus, não volte a dizer que me suga. Trata-se de um mero acordo entre amigos. Se quiser, pode reembolsar-me, quando tiver dinheiro.
- Sim, quando!
No entanto, terminou por ceder. Com efeito, já sabia que tal aconteceria. Assim, conservou-se no apartamento e deixou Ravelston ir à pensão pagar a renda e recuperar as duas malas de cartão. Permitiu mesmo que lhe «emprestasse» duas libras para despesas correntes. Ao mesmo tempo, porém, sentia-se amargurado. Vivia à custa dele, sugava-o. Como poderia jamais tornar a haver amizade entre ambos? De resto, no fundo não queria ser ajudado. Apenas desejava que o deixassem em paz. Caminhava para a valeta e ansiava por se encontrar lá, de uma vez por todas, para pôr termo definitivo a uma existência atribulada e mesquinha. Todavia, para já, permaneceria no apartamento simplesmente porque carecia de coragem para recusar a oferta.
Mas quanto a arranjar novo emprego, tratava-se de uma ideia impraticável. O próprio Ravelston, apesar de rico, não podia inventar ocupações remuneradas. De qualquer modo, Gordon sabia que- não havia vagas no comércio dos livros. Durante os três dias imediatos, gastou as solas dos sapatos a visitar livrarias consecutivas. À entrada de cada uma, cerrava os dentes, transpunha-a, pedia para falar com o gerente e, três minutos mais tarde, retirava-se de mãos vazias.