O Vil Metal - Cap. 6: Capítulo 6 Pág. 97 / 257

- Não estará a exagerar um pouco?

- Não. Todo esse palavreado que ventilámos não passa da objectivação dos nossos sentimentos. É tudo ditado pelo que temos nos bolsos. Percorro Londres a badalar que é uma cidade dos mortos, a nossa civilização está moribunda, desejava que rebentasse a guerra e sei lá que mais, e tudo isso significa que o meu salário se resume a duas libras semanais e queria que fossem cinco.

Ravelston, mais uma vez recordado obliquamente dos seus rendimentos, friccionou o nariz com o nó do indicador esquerdo.

- Até certo ponto, concordo consigo, claro. Aliás, no fundo, é o que Marx disse. Todas as ideologias são o reflexo das circunstâncias económicas.

- Ah, mas você só abarca a situação através de Marx! Não sabe o que' significa uma pessoa arrastar-se ao longo de uma semana com duas libras. Não se trata de uma questão de dificuldades... nada de tão decente como isso, mas da maldita sordidez subjacente. Viver só durante semanas sem fim, porque uma pessoa sem dinheiro não tem amigos. Intitula-se escritor e nunca produz nada porque está sempre demasiado acabrunhado para ter disposição criativa. Vive numa espécie de submundo infecto, de esgoto espiritual.

Gordon começara a desbobinar o seu rosário. Nunca permaneciam juntos muito tempo sem que principiasse a perorar naquele estilo. Era uma das mais hediondas formas de manifestar falta de maneiras, que embaraçava Ravelston profundamente. Não obstante Gordon não o podia evitar. Tinha de descrever os seus problemas a alguém. E Ravelston era a única pessoa que compreendia. A pobreza, como qualquer outra ferida infectada, tem de ser exposta ocasionalmente. Começou a referir-se em pormenores obscenos à sua vida em Willowbel Road. Arengou sobre o cheiro dos despejos e couves, os frascos de molho salpicados na sala de jantar, a comida horrível, as aspidistras. Aludiu às suas chávenas de chá clandestinas e ao ardil de fazer desaparecer as respectivas folhas usadas pela sanita.





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