Natureza! universo!... Vidas infindáveis eternamente circulando numa vida única. Assombro, esplendor, pavor, deslumbramento! O homem vacila, desmaia, quer equilibrar-se... mas onde, se não há terra em que poise, nem muro a que se encoste?! Tudo impalpável, fugaz, incerto, ilusório, ilimitado... tudo vida, tudo sonho, tudo voragem... Se baixa os olhos do imenso ao grão de areia, o grão de areia, infinitésimo, resolve-se-lhe em vidas infinitas. Quer contemple o universo, quer examine um corpúsculo, a alma engolfa-se estonteada, no mesmo abismo devorador e criador.
Abismo de aparências ocultas, abismo de vozes que se não ouvem. A natureza taciturna exprime-se magicamente, em línguas vagas, silenciosas. E quando num pouco de cisco murmuram mais vontades do que bocas humanas há na terra, o que não dirá o colóquio formidando de todas as vontades do universo! Tem cada organismo a sua língua peculiar. Os que vivem mais próximos entendem-se melhor. O ar segreda à água, a raiz ao lodo, a luz à folha. o pólen ao ovário. Há fluidos que se casam, raízes que se querem bem. O oxigénio é intimo do ferro, o azougue é íntimo do ouro. Os orbes fraternizam, os metais amalgamam-se, e as electricidades sexuadas buscam-se avidamente, para copular!
Matéria infinita – forças infinitas, infinitamente caminhando. E no pélago vertiginoso da mobilidade universal é cada átomo invisível um desejo que nasce, um desejo que sente, um desejo que fala...
O léxico sem princípio nem fim, das vozes mudas do incriado, das línguas tácitas da natureza, alguém o ouviu que se recorde? Alguém: o homem.