Eurico, o Presbítero - Cap. 8: Capítulo 8 Pág. 36 / 186

— Táriq — dizia o godo —, amanhã ao romper de alva é necessário que todos estes penhascos empinados sobre nossas cabeças se coroem dos teus soldados e que não tardes em fortificar essa estreita passagem que une o promontório do Calpe com o resto do continente. É aqui, nesta serra inacessível, que deves esperar o resto dos libertadores da Espanha; é daqui que deves sair com os teus irmãos do deserto para quebrar o ceptro do tirano Roderico. Se a sorte das armas nos for contrária, esperaremos neste lugar novos socorros de África. Septum nos fica fronteiro, e Septum entreguei-to eu...

Táriq não o deixou continuar. Como o leão, pulando subitamente dos juncais da Mauritânia, o moço árabe pôs-se em pé, com o gesto colérico, e exclamou:

— Váli dos cristãos! quem te fez crer que Táriq podia ser vencido? Vi em sonhos o profeta de Deus, que me disse: «a Espanha curvar-se-á ao Corão», e Mohammed não mente! Ainda sem ti, eu me teria arrojado sobre o Império Godo, e a minha lança o faria cair a meus pés moribundo, quando Sebta me tivesse fechado as portas; quando todos vós os godos estivésseis unidos contra mim. Deus é grande, e Mohammed o seu profeta!

As palavras violentas do árabe revelaram-me quem era o guerreiro godo. Juliano capitaneou, como nós, uma tiufadia na guerra cantábrica e foi valente soldado. Sabia que ele fora elevado à dignidade de conde de Septum, e que aí se cobrira de glória, repelindo os inimigos do império que já tinham tentado conquistar aquela província. Como e porque atraiçoou a terra natal? Ódios civis o levaram a tanta infâmia, segundo entendi das suas palavras. Parricida e fratricida a um tempo, busca vingar-se, talvez de bem poucos de seus irmãos, esmagando-os debaixo das ruínas da pátria. A memória deste mal-aventurado será réproba e maldita das gerações remotas!





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