Inferno - Cap. 25: Capítulo 25 Pág. 74 / 102

Se agora, leitor, te mostrasses renitente em crer no que direi, tal não me espantaria, pois eu, que o vi, mal ouso acreditá-lo. Quando tinha os olhos fitos neles, eis que uma serpente com seis patas se lançou a um e toda nele se enroscou. Com as paras do meio rodeou-lhe o ventre e com as da frente os braços Ihe prendeu; depois fincou-lhe os dentes numa e noutra face, enquanto com as paras traseiras as coxas lhe abria, passando a cauda por entre as duas e erguendo-a atrás, por sobre os rins. Jamais se viu hera à árvore agarrada como a horrível fera cingiu aqueles membros com os seus. Um com o outro se confundiram logo, como se de cera aquecida fossem e de tal modo as suas cores se misturaram que nem um nem outro pareciam o que eram, como ante o ardor da chama pelo papel alastra uma cor escura que não é ainda negro, mas o branco morre.

Os outros dois olhavam e cada um deles dizia: «Oh, Agnel, como estás transformado! Repara que já não és nem um nem dois.» As duas cabeças eram já uma só, quando surgiram duas figuras misturadas numa só face, onde haviam desaparecido as duas. Os dois braços em quatro membros se tornaram, e as coxas, as pernas, o ventre e o torso converteram-se em membros nunca vistos. Todo o antigo aspecto se sumira; com ambas e nenhuma se parecia a forma transmutada, e assim se afastou a passo lento.

Como o lagarto nos dias de ardor canicular, ao mudar de sebe atravessa o caminho como um raio, assim parecia, lançando-se ao ventre dos dois outros, uma pequena serpente furiosa, lívida e negra como o grão de pimonta; e por aquela parte onde primeiro nos entra o alimentos atravessou um deles e depois tombou estendida aos seus pés. O que fora picado olhou-a, mas não disse nada; antes, mantendo-se a pé firme, bocejava como se a febre ou o sono o assaltassem. Ele e a serpente olhavam-se e, um pela ferida e a outra pela boca, soltavam um espesso fumo que se misturava.





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