O meu grão proporcionou-me um bem-estar incalculável, e foi para mim um recurso precioso. A falta de instrumentos, conforme já disse, tornava-me o trabalho mais demorado e penoso. Além disso, não devia dar grande importância a esta perda de tempo, porque depois da maneira de que me valera para regular as minhas ocupações, destinava cada dia àquele trabalho um certo número de horas, e como tinha resolvido não tocar na minha actual colheita, ficava com seis meses de tempo para inventar e executar os utensílios convenientes para deles tirar partido. Desde logo, precisei de lavrar um terreno maior, porque tinha agora bastante grão para semear, mais de uma fanga; e como não podia preparar a terra convenientemente sem enxada, comecei a fabricar uma, o que me levou menos de uma semana. Era, todavia, tão grosseira e tão informe que o meu trabalho se tornou ainda mais pesado; mas nada pôde deter-me nem desanimar-me: cheguei a arrotear dois pedaços de terra plana, os mais perto da minha habitação que pude encontrar, e rodeei-os de uma forte paliçada da mesma espécie de estacas com que tinha cercado a casa, e que ali tinha enraizado. Sabia que ao fim de um ano formaria um valado vivo. Gastei três meses nesta obra, porque me encontrava então na estação chuvosa, o que contribuía para que raras vezes pudesse sair.
Diversos objectos ocupavam o meu tempo quando as chuvas me retinham em casa; enquanto trabalhava divertia-me a falar com o papagaio, que aprendeu com a maior rapidez o seu nome, «Poll», e a pronunciá-lo claramente. Foi esta a primeira palavra que ouvi articular na ilha por boca diferente da minha. Mesmo assim, isto não passava de uma mera distracção, comparado com a grande tarefa de que vou falar. Havia muito tempo já que pensava fabricar algumas vasilhas de terra, de que muito necessitava; mas não sabia como arranjar-me para o conseguir.