Robinson Crusoe - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 12 / 241
Com respeito ao regresso a casa, uma vergonha indesculpável destruía dentro do meu espírito todo o bem que me adviria dessa resolução. Imaginava já o modo como todos me apontariam com o dedo, como coraria por comparecer não só perante os meus pais, mas também fosse de quem fosse. Muitas vezes tive ocasião de notar quão perverso e irracional é o génio dos homens e, sobretudo, o dos jovens, que em vez de se guiarem pela razão em tais circunstâncias, por um lado, não se sentem confusos das suas faltas e, por outro, se envergonham do seu arrependimento, ruborizando-se, não pelas más acções que devem fazê-los passar por insensatos ou malvados, mas pelo seu regresso ao bem, que só lhes pode fazer merecer o título de prudentes.
À minha chegada a Londres tive a sorte de cair em , boas mãos, coisa que muito raramente acontece aos jovens tão estarolas e obstinados como eu, não tardando o espírito maligno a armar uma porção de laços à sua inexperiência. A primeira pessoa com quem travei conhecimento foi um comandante de buque que acabava de chegar da Guiné e que, tendo tido muita sorte naquelas costas, havia resolvido lá tornar. A minha conversa agradou tanto ao dito comandante (porque naquele tempo não precisava de originalidade), que me propôs que embarcasse com ele, pois tinha-me ouvido dizer que sentia desejos vivíssimos de ver o mundo. Esclareceu-me ao mesmo tempo que não teria de fazer qualquer espécie de despesas; que comeria com ele e seria o seu companheiro inseparável; que se quisesse levar alguma coisa para negociar, talvez o ganho que obtivesse ultrapassasse as minhas esperanças.
Aceitei a proposta e entabulando uma íntima amizade com o comandante, que era um homem franco e honrado, consenti em seguir com ele para a Guiné.