Robinson Crusoe - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 17 / 241
Esta circunstância despertou os meus projectos de fuga, pois reflecti que me achava em condições de ter uma chalupa sob as minhas ordens; e, logo que o meu amo se retirou, comecei a preparar-me não para uma pesca, mas para uma viagem, sem ainda saber que rota seguir, porquanto, de qualquer modo, sair daquele sítio seria o meu verdadeiro caminho.
O primeiro passo que dei foi pedir ao mouro que nos arranjasse comida para o tempo que estivéssemos a bordo, dizendo-lhe que não devíamos contar com o pão do nosso amo. Respondeu que era verdade e foi de seguida buscar uma grande cesta com bolachas e três tonéis de água fresca. Eu sabia o sítio em que se encontrava a arca que continha os licores do meu amo, cuja construção atestava que provinha de uma presa inglesa. Enquanto o mouro foi a terra, tirei as garrafas e transportei-as para a chalupa, como se tivessem sido embarcadas antes, para uso do nosso dono. Levei também um grande pedaço de cera que pesava mais de cinquenta libras, um pacote de cordéis, um machado, uma serra e um martelo; coisas que me foram depois sumamente úteis, sobretudo a massa de cera, com a qual fiz velas. A seguir armei ao meu homem uma armadilha na qual caiu com a melhor das intenções. Chamava-se Ismael, ou melhor, Muley ou Moley, segundo a alteração que sofre naquele país.
- Muley - disse-lhe -, nós temos aqui as escopetas do nosso amo. Não poderias arranjar-nos um pouco de pólvora e chumbo? Talvez tenhamos ocasião de matar por nossa conta algumas aves marinhas. Sei que o amo deixou a bordo do buque as provisões da Santa Bárbara.
- É verdade - respondeu-me -; vou buscá-las. Depressa voltou com duas bolsas de coiro, uma muito grande, com mais de uma libra e meia de pólvora, a outra cheia de chumbos e algumas balas, a qual pesava cinco ou seis libras. Colocámos tudo a bordo. Pela minha parte; também havia encontrado pólvora no camarote do comandante e tinha enchido uma das grandes garrafas tiradas da arca, depois de haver esvaziado o resto do licor noutra que encontrei.