Robinson Crusoe - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 7 / 241

Mas como esta enseada passava por ser tão boa como uma baía e achando-se bem amarradas as nossas âncoras, que eram muito sólidas, os marinheiros pouco caso faziam do temporal, e tão pouca preocupação sentiam por qualquer perigo que pudesse ocorrer, que passavam o tempo a descansar e a divertir-se à maneira da gente do mar. Apesar disso, no oitavo dia pela manhã o vento aumentou, e todos metemos mãos à obra para arriar os mastaréus e manter tudo preparado e apertado para que o barco pudesse conservar-se ancorado o mais facilmente possível.

Por volta do meio-dia o mar cresceu com força, e o nosso castelo de popa mergulhava de tal modo no mar que a água atravessava e varria o convés; por uma ou duas vezes chegámos a julgar que a âncora tinha cedido. Então o comandante ordenou que largássemos a âncora mestra para impedir que o buque retrocedesse, depois de ter largado os cabos até ao fim.

Por essa altura desencadeou-se então um temporal horrível, e comecei a ver agora o terror e o estupor mesmo nos rostos dos próprios marinheiros. Embora o comandante tomasse todas as precauções necessárias para a salvação do buque, quando entrava e saía do seu camarote, ouvi-o por várias vezes exclamar à minha frente:

- Senhor, tende compaixão de nós, ou morreremos todos! Estamos perdidos!

Durante estes primeiros apuros achava-me eu estendido estupidamente no camarote, que ficava na proa, e não sabia dizer qual era a situação do meu espírito. Não podia pensar sem vergonha no meu primeiro arrependimento, tão depressa esquecido pelo meu coração endurecido. Os horrores da morte, afugentados de mim, tornaram a surgir quando ouvi aquelas palavras do comandante. Saí do camarote para ver o que se passava. Jamais espectáculo tão espantoso me ferira a vista: as ondas, como montanhas, ameaçavam envolver-nos de um momento para o outro; para qualquer parte que o meu olhar se dirigisse apenas via desolação.





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