Nunca correu tão depressa a água pelo canal do moinho, quando mais das suas pós se acerca, do que o meu mestre por essa vertente, contra o peito me levando como um filho, e não como um companheiro. Assim que tocou os pés no fundo, já estavam eles sobre a borda da margem, por cima de nós; mas não havia que ter medo deles, pois a alta providência que do quinto fosso os quis fazer ministros a todos privou do poder de se afastarem dele.
Ali em baixo deparou-se-nos uma gente pintadas que em redor caminhava, a passo lento, chorando, com semblante cansado e derrotado. Vestiam capas, com capuzes até aos olhos baixados, feitas do mesmo corte que as dos monges de Clúnia. Por fora eram de um dourado deslumbrante, mas por dentro eram de chumbo, e tão pesadas que, ao pé delas, as que Frederico punha eram de palha3. Oh, manto eternamente penoso! Voltárnos mais ainda para a esquerda, caminhando na mesma direcção que eles e o seu triste pranto ouvindo; mas, devido ao peso, tão devagar aquela gente ia que cada vez que uma perna erguíamos nos surgiu uma nova companhia.
Assim, disse ao meu guia «Faz por encontrar algum que pelos feitos ou pelo nome seja conhecido e vai olhando em torno ao caminhar.» E um que entendia a língua da Toscana detrás de nós gritou: «Detende-vos, vós que tanto correis através do escuro ar! Voltou-se então o meu guia e disse: .«Aguarda e depois acerta o passo pelo seu.» Detive-me e vi dois revelarem a grande pressa que de estar comigo tinham, mas retardavam-nos a carga e a estreiteza do caminho. Quando de mim se aproximaram, com olhar turvo detidamente me observaram, sem dizerem palavra; depois um para o outro se voltaram e disseram entre si: «Este parece vivo pelo mexer da garganta. E, se mortos são, por que privilégio seguem despidos da pesada estola?» Depois disseram para mim: «O toscano, que vieste ao recinto dos hipócritas tristes, não desdenhes de dizer-nos quem és.»