Tinha de entrar na pensão até às onze, sob pena de provocar a indignação da proprietária. Gordon prosseguiu até ao extremo da Tottenham Court Road, onde subiu para um «eléctrico». Sempre era um péni mais barato que o autocarro. No banco de pau, tinha por companheiro de viagem um escocês baixo e pouco asseado que lia a página desportiva do jornal e tresandava a cerveja. Gordon estava muito contente. Rosemary seria sua amante. Vivamente, o vento ameaçador varre... Ao ritmo dos solavancos do «eléctrico", murmurou as sete estrofes completas do seu poema. Ao todo, seriam nove. Era bom. Acreditava nele e em si próprio. Era um poeta. Gordon Comstock, autor de Ratos. Até nos Prazeres Londrinos acreditara outrora.
Pensou no domingo. Tinham combinado encontrar-se às nove da manhã, na estação de Paddington. A viagem custaria cerca de dez xelins, que ele arranjaria, ainda que tivesse de empenhar a camisa.
E ela tornar-se-ia sua amante; talvez já nesse dia, se a oportunidade se proporcionasse. Não tinham proferido uma única sílaba nesse sentido. Tratava-se de uma' espécie de acordo tácito.
Oxalá fizesse bom tempo! O Inverno já principiara a fazer-se sentir, mas prouvesse a Deus que fosse um daqueles admiráveis dias sem vento, quase de Verão, em que uma pessoa se pode deitar nos arbustos durante horas sem sentir frio! Em todo o caso, os dias assim não abundavam - uma dúzia em cada Inverno, quando muito. O mais certo era chover de manhã à noite. Eles não tinham para onde ir, excepto o ar livre. Há tantos pares de- namorados em Londres «sem terem para onde ir», além das ruas e os parques, em que não existe a menor intimidade e faz sempre frio! Não é fácil fazer amor num clima frio, quando não há dinheiro. O motivo de- «nunca o momento e lugar apropriados» não tem sido suficientemente explorado nos romances.