Ravelston hesitou, recuou um passo e fez o nó do indicador deslizar pelo nariz. A situação exigia firmeza, mas ele nunca se mostrara firme em todo a sua vida. Olhou de Dora para Gordon e deste para Bárbara. O que lhe foi fatal. A partir do instante em que os encarou abertamente ficou perdido. Que outra coisa podia fazer, meu Deus!
Tratava-se de seres humanos, não os podia insultar. O mesmo instinto que o induzia a levar a mão à algibeira quando via um pedinte tornava-o apático naquele instante. Pobres raparigas! Faltava-lhe a coragem para as mandar à vida. Apercebeu-se de súbito de que teria de prosseguir na aventura abominável para a qual Gordon o arrastara. Pela primeira vez na sua existência, deixava-se convencer a acompanhar uma prostituta.
- Mas francamente!... - arriscou ainda.
- Allons-y - indicou Gordon.
O motorista do táxi inteirou-se do destino, quando Dora lhe fez sinal com um movimento de cabeça. Gordon instalou-se a um canto e pareceu mergulhar imediatamente num imenso abismo do qual emergiu mais gradualmente e apenas com a consciência parcial do que fazia. Deslizava com suavidade através da escuridão ornamentada com luzes como estrelas. Ou estariam as luzes a mover-se e ele estacionário? Era como se se encontrasse no fundo do oceano, entre peixes luminosos que evolucionavam à sua volta. Reapareceu-lhe a ideia vaga de que era uma alma, maldita no inferno. A paisagem no inferno não devia diferir muito daquela. Ravinas de fogo de cores hediondas, encimadas por escuridão absoluta. Mas aí haveria tormento. Seria aquilo tormento? Esforçou-se por classificar as suas sensações. O mergulho momentâneo na inconsciência deixara-o fraco, agoniado, abalado - a fronte parecia fragmentar-se. Estendeu a mão e encontrou um joelho, uma liga e outra mão, que procurou mecanicamente a sua. Deu-se conta de que Ravelston, sentado do outro lado, lhe tocava com impaciência.
- Acorde, Gordon!
-Hem?
- Gordon! Biens, causons en français. Qu'est-ce que vous avez fait? Croyez-vous que je veux coucher avec une sale?... Ora, maldição!