Fazia parte de uma tentativa de sempre para se furtar à sua própria classe e tornar-se, por assim dizer, membro honorário do proletariado. À semelhança de todas as tentativas do género, estava antecipadamente condenada ao malogro. Nenhum rico consegue jamais disfarçar-se de pobre, porque o dinheiro, como a verdade, acaba sempre por vir à superfície.
Na porta da rua, havia uma placa de latão com os dizeres:
P. W. H. RAVELSTON
Anticristo
Ravelston vivia no primeiro andar e os escritórios editoriais do Anticristo situavam-se nos baixos da casa.
O Anticristo era um mensário de médio a alto intelecto, socialista de uma forma veemente, porém mal definida.
De um modo geral, dava a impressão de ser editado por um ardente não-conformista que transferira a sua lealdade de Deus para Marx e, ao fazê-lo, se envolvera com um bando de poetas de vers libre. Isto não correspondia realmente ao carácter de Ravelston. Tratava-se meramente de que tinha um coração menos duro do que compete a um editor, pelo que se achava à mercê dos seus Colaboradores. Praticamente tudo era publicado no Anticristo, se ele suspeitava de que o respectivo autor passava fome.
Ravelston apareceu pouco depois, em cabelo e calçando luvas de couro de cano comprido. Notava-se à primeira vista que era um jovem rico. Usava o uniforme da intelligentsia endinheirada; um velho casaco de tweed mas confeccionado por um bom alfaiate e daqueles modelos que se tornam mais aristocráticos com a idade -, calça de flanela cinzenta folgada, camisola de lã da mesma cor e sapatos castanhos assaz usados. Empenhava-se em ir a toda a parte, mesmo a casas elegantes e restaurantes dispendiosos, com aquela indumentária, para manifestar o desprezo que as convenções da classe superior lhe mereciam, sem se aperceber de que somente as classes superiores podem fazer essas coisas. Embora fosse um ano mais velho que Gordon, parecia muito mais jovem. Muito alto, tinha, um corpo elegante de ombros largos e a graça indolente típica da juventude das classes superiores.
