ANJO
Esta é; que demandais?
FIDALGO
Que me leixês embarcar.
Sou fidalgo de solar,
é bem que me recolhais.
ANJO
Não se embarca tirania
neste batel divinal.
FIDALGO
Não sei porque haveis por mal
que entr’a minha senhoria...
ANJO
Pera vossa fantesia
mui estreita é esta barca.
FIDALGO
Pera senhor de tal marca
nom há aqui mais cortesia?
Venha a prancha e atavio!
Levai-me desta ribeira!
ANJO
Não vindes vós de maneira
pera ir neste navio.
Essoutro vai mais vazio:
a cadeira entrará
e o rabo caberá
e todo vosso senhorio.
Vós irês mais espaçoso
com fumosa senhoria,
cuidando na tirania
do pobre povo queixoso;
e porque, de generoso,
desprezastes os pequenos,
achar-vos-ês tanto menos
quanto mais fostes fumoso.
DIABO
À barca, à barca, senhores!
Oh! que maré tão de prata!
Um ventezinho que mata
e valentes remadores!
Diz, cantando:
Vós me veniredes a la mano,
a la mano me veniredes.