Sangue Azul - Cap. 21: 9 Pág. 237 / 287

Foram mostradas a Anne várias cartas escritas por ele na altura, em resposta a solicitações urgentes de Mrs. Smith, e de todas elas transpirava a mesma resolução inflexível de não empreender um trabalho improfícuo e, sob uma civilidade fria, a mesma indiferença empedernida por todos os males que esse procedimento lhe pudesse causar a ela. Era um quadro terrível de ingratidão e desumanidade, e em certos momentos Anne sentiu que nenhum crime claro e flagrante poderia ter sido pior. Teve muito que ouvir. Todos os pormenores de cenas tristes passadas, todas as minúcias de aflição atrás de aflição que em conversas anteriores tinham sido meramente insinuadas, foram agora esmiuçadas com uma complacência natural. Anne compreendia perfeitamente o extraordinário alívio desses desabafos, que só aumentavam a sua admiração pela serenidade do habitual estado de espírito da amiga.

Havia na história dos seus agravos uma circunstância de particular irritação. Tinha boas razões para crer que alguns dos bens do marido nas Índias Ocidentais, que se encontravam há muitos anos sob uma espécie de arresto para pagamento dos seus próprios encargos, poderiam ser recuperáveis desde que tomadas as providências adequadas. E esses bens, embora não fossem de grande monta, seriam suficientes para a tornar relativamente rica. Mas não havia ninguém que tratasse do assunto. Mr. Elliot não fazia nada, e ela própria também nada podia fazer, incapacitada tanto de se deslocar pessoalmente pelo seu estado de fraqueza física, como de encarregar outros de o fazerem por falta de dinheiro. Não tinha quaisquer relações naturais que pudessem valer-lhe sequer com o seu conselho, e não dispunha de meios para recorrer à assistência das leis. Isto representava um agravamento cruel de uma situação económica já de si realmente apertada.





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