Procurar livros:
    Procurar
Procurar livro na nossa biblioteca
 
 
Procurar autor
   
Procura por autor
 
marcador
  • Sem marcador definido
Marcador
 
 
 

Capítulo 26: XXV - Natal dos pobres

Página 147
Não tinha coração para o dar a criar.

– A gente não podemos ter filhos.

– Eu cá era uma inocente. Até me dá riso! Tinha treze anos e foi logo ao entrar para a fábrica. O mestre foi quem me desfrutou. Agarrou-me, mas eu não sabia e pus-me a chorar. – Cala-te! se dizes, vais para a rua! – Abandonou-me, outros vieram... A gente há-de cumprir o seu fado.

– Eu cá fui um miminho. Meu pai tinha de seu...

Depois tudo esqueci, porque senão a gente morria. Meu pai era muito meu amigo. Era preciso não ter coração para o enganar. Nem ele podia supor mal de mim, nem do outro que entrava na nossa casa. Meu pai era também muito amigo dele e tinha-lhe valido sempre. Ainda me lembro, quando meu pai comigo no colo me dizia: – Tu és o meu coraçãozinho... – Eu sempre tive um colo!

Olhai: embalava-me como às crianças. – Falta-te a tua mãe, mas eu sou a tua mãe, queres? – Era uma dor do coração enganá-lo e nós enganámo-lo ambos. E eu bem sabia que ele era casado, mas mentia-me...

– Porque será que os homens mentem sempre?

– Mentia-me sempre, e eu era inocente. Mentiu-me e mentia a meu pai. O pior é que um dia fiquei grávida. Começou o meu castigo. – Vou-lhe dizer tudo.

– Diz – disse ele. Mata-lo. Se queres diz... – Eu calei-me.

– E agora? – Agora... – Eu já lhe não queria, acho mesmo que nunca lhe quis deveras. Foi uma desgraça.

Já estava escrito que fosse desgraçada, acabou-se!...

Depois não podia esconder o meu erro. Só meu pai não reparava... E ele que me imaginava uma inocente!...

Esperai... – E agora? agora?... – perguntei-lhe. Então arranjei com que meu pai me deixasse ir com ele e a mulher para uma quinta. Se vós vísseis! A pobre da mulher! Batia-lhe sempre, tratava-a pior que a um cão.

– Cala-te! e ela calava-se, a pobre.

<< Página Anterior

pág. 147 (Capítulo 26)

Página Seguinte >>

Capa do livro Os Pobres
Páginas: 158
Página atual: 147

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Carta-Prefácio 1
I - O enxurro 18
II - O Gebo 23
III - As mulheres 28
IV - O Gabiru 35
V - História do Gebo 42
VI - Filosofia do Gabiru! 49
VII - Primavera 52
VIII - Memórias de Luísa 59
IX - Filosofia do Gabiru 63
X - História do Gebo 67
XI - Luísa e o morto 73
XII - Filosofia do Gabiru 77
XIII - Essa rapariguinha 81
XIV - O escárnio 87
XV – Fala 94
XVI - O que é a vida? 97
XVII - História do Gebo 109
XVIII - O Gabiru treslê 114
XIX - A Mouca 118
XX - A outra primavera 121
XXI - A Morte 126
XXII - A filosofia do Gabiru 130
XXIII - A Árvore 134
XXIV - O ladrão e a filha 139
XXV - Natal dos pobres 143
XXI - Aí têm os senhores a natureza! 154