– A gente não podemos ter filhos.
– Eu cá era uma inocente. Até me dá riso! Tinha treze anos e foi logo ao entrar para a fábrica. O mestre foi quem me desfrutou. Agarrou-me, mas eu não sabia e pus-me a chorar. – Cala-te! se dizes, vais para a rua! – Abandonou-me, outros vieram... A gente há-de cumprir o seu fado.
– Eu cá fui um miminho. Meu pai tinha de seu...
Depois tudo esqueci, porque senão a gente morria. Meu pai era muito meu amigo. Era preciso não ter coração para o enganar. Nem ele podia supor mal de mim, nem do outro que entrava na nossa casa. Meu pai era também muito amigo dele e tinha-lhe valido sempre. Ainda me lembro, quando meu pai comigo no colo me dizia: – Tu és o meu coraçãozinho... – Eu sempre tive um colo!
Olhai: embalava-me como às crianças. – Falta-te a tua mãe, mas eu sou a tua mãe, queres? – Era uma dor do coração enganá-lo e nós enganámo-lo ambos. E eu bem sabia que ele era casado, mas mentia-me...
– Porque será que os homens mentem sempre?
– Mentia-me sempre, e eu era inocente. Mentiu-me e mentia a meu pai. O pior é que um dia fiquei grávida. Começou o meu castigo. – Vou-lhe dizer tudo.
– Diz – disse ele. Mata-lo. Se queres diz... – Eu calei-me.
– E agora? – Agora... – Eu já lhe não queria, acho mesmo que nunca lhe quis deveras. Foi uma desgraça.
Já estava escrito que fosse desgraçada, acabou-se!...
Depois não podia esconder o meu erro. Só meu pai não reparava... E ele que me imaginava uma inocente!...
Esperai... – E agora? agora?... – perguntei-lhe. Então arranjei com que meu pai me deixasse ir com ele e a mulher para uma quinta. Se vós vísseis! A pobre da mulher! Batia-lhe sempre, tratava-a pior que a um cão.
– Cala-te! e ela calava-se, a pobre.