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Capítulo 26: XXV - Natal dos pobres

Página 150

E o banco cisma:

– Há que tempos que não sinto em mim a luz da manhã, que traz consigo a vida de tudo o que existe, dos rios, das outras árvores, nem o sol a crescer em vagas de oiro, nem a água verde, melancólica, e tão mansa entre os choupos que parece ir vogando já morta... Sinto-me transido... Transido? Isto é corno fogo, mas trespassa-me de frio. E não há nevão, mas ouço sempre gritos, ais, dores... Oh se fosse luar!... Destas enfermarias corre também um sonho parecido com luar... Será uma fonte?...

As fontes! nem te lembres das fontes!... Aqui parece que as minhas fibras mergulham num mar revolvido, que eu ignoro, mas que é feito de gritos.

Baixo a pedra começa também a lembrar-se e àquela hora perdida da noite toda a alma inconsciente do Hospital estremece. Quer recordar, palpita e logo esquece... Os sonhos dos doentes, dos pobres, dos tristes, materializam-se e são como nuvens: são de fogo, são de luar. Sombras aos bandos dissolvem-se, para outra vez se criarem.

– Acho que sempre é luar... E quando havia sol?

Torrentes corriam pelo meu tronco, inundavam a minha roupa cascosa e em volta numa poeira azul andava um turbilhão de bichos. Outras árvores flutuavam na mesma poalha e as suas folhas ou eram de sol ou todas de prata.

Longe – e que encanto aquela companhia sempre presente e amiga! – o fio do rio chalrava. Folhas caíam e iam devagarinho viajar sobre a água verde. Para onde?...

Debaixo de mim, até ao mais fundo das minhas raízes quantas vidas protegi e defendi!... As minhas raízes tocavam na vida!... Às vezes caia um pé de água, mas depois vinham sempre teias de sol, fios de sol, para me enredar – e o sol traz consigo um cheiro a terra e renovo que consola, o hálito dos montes e dos pinheiros meus amigos.

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Capa do livro Os Pobres
Páginas: 158
Página atual: 150

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Carta-Prefácio 1
I - O enxurro 18
II - O Gebo 23
III - As mulheres 28
IV - O Gabiru 35
V - História do Gebo 42
VI - Filosofia do Gabiru! 49
VII - Primavera 52
VIII - Memórias de Luísa 59
IX - Filosofia do Gabiru 63
X - História do Gebo 67
XI - Luísa e o morto 73
XII - Filosofia do Gabiru 77
XIII - Essa rapariguinha 81
XIV - O escárnio 87
XV – Fala 94
XVI - O que é a vida? 97
XVII - História do Gebo 109
XVIII - O Gabiru treslê 114
XIX - A Mouca 118
XX - A outra primavera 121
XXI - A Morte 126
XXII - A filosofia do Gabiru 130
XXIII - A Árvore 134
XXIV - O ladrão e a filha 139
XXV - Natal dos pobres 143
XXI - Aí têm os senhores a natureza! 154