Os Pobres - Cap. 4: III - As mulheres Pág. 32 / 158

– Antes morrer no rio!

– Eu cá – diz outra – tenho o corpo negro, mas que m’importa? Se o meu me deixasse antes queria acabar...

Pela minha salvação que ia direitinha ao rio.

– Depois queixai-vos... –ameaça a velha. – Sereis pior do que arroladas.

– Nem as pancadas dele me doem, e mais o meu fez-me comer terra – afiança outra.

– A gente não tem mais ninguém no mundo. Quem quer saber duma desinfeliz?

– A gente não tem pai nem mãe, nem fôlego vivo.

– Se choro, os outros riem-se. Quem entra e sai que se importa?

– E ninguém neste mundo pode chorar sozinho...

– Eu cá – diz a Mouca – eu cá estou tão habituada a que me dêem dinheiro, que se o meu amigo fica comigo, escondo moedas no lençol... Quando acordo e as encontro, parece que me pagaram.

As outras riem-se com risos que destoam, e a patroa prega-lhes:

– Vocês nem sequer vêem... O que aconteceu à Maria? Afogou-se e o amante ri. Hélia lá foi pra o hospital. É morta. E todas morrem se se deixam ter coração.

– Às vezes mais vale morrer.

– Morrer!... – exclama a tísica.

– Eu já me matei... E depois? Foi quando me vi sozinha no mundo. Ele tinha-me desprezado. Peguei e bebi um quarteirão de aguardente com lumes. Pensais que estou arrependida? Ah, se a senhora soubesse o que se sente!... Quando me vieram dizer – foi a Mouca – que o meu amigo estava com a outra, foi como se tornasse a ressurgir diante de mim a mãe que eu matei à força de lágrimas, por me ver na triste vida. Nem podia gritar.

Tinham-me secado os gritos aqui – na boca... Saí, andei...

A porta dela estava fechada e ali fiquei até de manhã ao frio. Os homens que passavam diziam o que lhes parecia, porque ninguém ideia o que cada um traz dentro do coração. Cismei, passei a noite ora a cismar, ora a chorar.





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