Tem passado fome, tem vivido só com pão e cisma, preso a nuvens e de súbito dá de cara com o escárnio. 
Há quem se ria da dor, dos gritos, da tragédia. O mal faz rir? Faz. A dor faz rir? Faz. E a desgraça? Também. 
Os ladrões e as mulheres têm vontade de espezinhar porque odeiam e não compreendem o sonho. 
Arrastem para um tablado as piores ruínas e as mais amargas catástrofes, que a multidão gargalha. Ponham a fome a ulular, que a matéria ri. Ri de tudo o que é triste, pobre e torto – e do que é belo como os astros. 
Ressuma raiva o escárnio. Neste riso há sempre gritos. Toca a gargalhar da desgraça e da dor; transformam em força toda a tragédia humana. 
– Diz que estás apaixonado? 
O Gabiru cala-se. 
– Tu não falas?... Ah tu não falas, enguiço?... É desta que tu gostas? 
– É de mim? – pergunta a tísica e tosse, rindo-se. 
– É de mim? – Está ao pé da cova e espezinha, ri com  ódio, pelo que sofreu na vida. 
Cessam num momento os risos. O que sentem todos é vontade de o calcar, de o tornar raso como eles... 
– É por esta? Não? Então tu imaginas que há alguém que goste de ti, meu desengonçado? Tu!... Vocês vêem-no? Nem sei que parece! Aí vai o poeta!... 
Dá-lhe um encontrão, atira-o e, entre risos e chufas, vai de mão em mão como um trapo. Todos têm vontade de o amachucar, de o tornarem mais reles, mais triste, mais pobre e transido, por não lhe poderem tirar o pão da sua vida – o sonho. 
– Aí vai o poeta!... 
Até que o largam. De pé no meio da sala, com o casaco roto, amolgado, exclama, não compreendendo: 
– Mas eu que fiz? eu que fiz?... – Vai rir? vai chorar?... 
As gargalhadas redobram ao verem-no espantado e pícaro. As bocas más clamam, cheias de gritos. O seu olhar aflito procura a Mouca e vê-a rir-se também.