Inferno - Cap. 33: Capítulo 33 Pág. 98 / 102

Quando um débil raio penetrou na dolorosa cela e eu percebi naqueles quatro rostos o meu próprio semblante, mordi ambas as mãos de dor, e eles, pensando que o fazia por vontade de comer, de súbito se ergueram e disseram: «Pai, bem menos dor sentiremos se nos comeres a nós: já que foste tu quem nos vestiu destas míseras carnes, sê tu a despojar-nos delas.» Acalmei-me então, para lhes não causar maior tristeza, e aquele dia e outro passamos mudos todos. Ai de mim, dura terra, porque não te abriste? Quando chegou o quarto dia, Gaddo deitou-se por terra aos meus pés e perguntou: «Meu pai, por que razão me não ajudas?» Morreu então e eu, como tu me vós a mim, vi morrer os três um após outro, entre o quinto e o sexto dia. Já cego, buscava às apalpadelas cada um, e durante dois dias os chamei depois de estarem mortos. Depois, mais do que a dor teve poder a fome.»

Dito isto, com os olhos revirados, voltou a meter os dentes ao mísero crânio, e tão violentamente como os de um cão se fincaram no osso. Ah, Pisa, vitupério das gentes do belo país onde se ouve o si! Já que os teus vizinhos são lentos em punir-te, movam-se a Capraia e a Górgona4 e na foz do Arno uma barreira formem, de modo que ele afogue todos os que deu tro de ti vivem; que, se o conde Ugolino tinha fama de os teus castelos ter entregue, não deverias tu seus filhos condenar a tal martírio. A idade tenra tornava inocentes, ó nova Tebas, Ugoccione e o Brigata e os outros dois que no canto acima se referem!

Seguimos para diante, até onde o gelo rudemente apertava uma outra gente, não voltada para baixo, mas antes toda virada para cima. Impedia-os de chorar o próprio pranto, e a dor que sobre os olhos achava barreira voltava-se para dentro deles, acrescendo a sua angústia, pois as primeiras lágrimas formavam um muro e, como viseiras de cristal, cobriam sob as pálpebras todo o olho.





Os capítulos deste livro