Madame Bovary - Cap. 16: VIII Pág. 160 / 382

Hippolyte, o moço da estalagem, recebeu os cavalos do cocheiro e, coxeando do seu pé boto, levou-os pelas rédeas para o alpendre do Leão de Ouro, onde se juntaram muitos camponeses a admirar a carruagem. Rufou o tambor, o obus troou e todos os senhores, em fila, subiram ao estrado, onde tomaram lugar nas poltronas de veludo vermelho, emprestadas pela Sr.a Tuvache.

Toda aquela gente se assemelhava. As deslavadas fisionomias louras, um pouco tisnadas pelo sol, tinham a cor da sidra doce e as suíças estufadas saíam dos grandes colarinhos engomados, apertados por gravatas brancas com enormes nós. Todos os coletes eram de veludo e cruzados; todos os relógios tinham, na extremidade duma comprida fita, um sinete oval de cornalina; e todos apoiavam as duas mãos sobre as duas coxas, afastando cuidadosamente as pernas, mostrando o tecido das calças, que, por não ter sido deslustrado, brilhava mais do que o couro das botas grossas.

As damas da sociedade ficavam atrás, no vestíbulo, entre as colunas, enquanto a maioria do povo estavam na frente, de pé, ou então sentado em cadeiras. Efectivamente, Lestiboudois levara para lá todas as que retirara do prado e continuava a ir, de minuto a minuto, buscar mais algumas à igreja, causando tal atravancamento com o seu negócio que se tinha muita dificuldade em chegar até à pequena escada do estrado.

- Eu acho - disse Lheureux (dirigindo-se ao farmacêutico, que passava para ocupar o seu lugar) - que se deviam ter levantado ali mais dois mastros venezianos, que qualquer coisa diferente, mais séria e mais rica. Teriam produzido um bonito efeito.

- Era mesmo - respondeu Homais. - Mas que quer? Foi o administrador que tomou tudo à sua conta. O pobre Tuvache não tem lá grande gosto e é mesmo destituído de tudo o que seja o espírito das artes.





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