Inferno - Cap. 5: Capítulo 5 Pág. 15 / 102

O amor, que a nenhum amado poupa o ter de amar, a este me prendeu com tão forte paixão que, como vês, nem agora me abandona. A uma mesma morte o amor nos conduziu e Caina aguarda quem da vida nos privou!»

Tais foram as palavras que lhes ouvi. Escutando aquelas almas feridas, inclinei a face, e tanto tempo assim permaneci que o poeta me interpelou: «Que pensas?» Quando respondi, assim o fiz: «Oh, inditosos, quantos doces pensamentos, quanto desejo os levaram a tão doloroso transe!» Depois voltei-me para eles e lhes disse: «Francesca, os teus martírios de tristeza me fazem chorar e piedade; mas diz-me: no tempo dos doces suspiros, como e porquê vos permitiu o amor que os torvos desejos conhecêsseis?» E ela a mim: «Maior dor não pode haver que na miséria recordar felizes tempos. Mas, se a primeira raiz do nosso amor tanto desejas conhecer, farei como quem fala e ao mesmo tempo vai chorando. Por prazer líamos um dia como se apoderou o amor de Lancelote; encontrávamo-nos sós e sem cuidados. Muitas vezes a leitura nos fez olhar nos olhos um do outro e pálidos ficar; mas um só passo foi que nos venceu. Quando lemos que os desejados lábios sorridentes por tal amante foram osculados, este, que jamais de mim se apartará, na boca me beijou, todo fremente. O nosso Galeotto foi o livro e mais quem o escreveu; nesse dia não prosseguimos a leitura.»

Enquanto assim falava uma das almas, a outra ia chorando, de tal modo que a piedade me fez desfalecer como se estivesse à morte e cal como o corpo cai perdendo a vida.





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