1984 - Cap. 18: Capítulo XVIII Pág. 244 / 309

Todos sentados, calados e imóveis. Diante de Winston estava um homem sem queixo e sem dentes que parecia exatamente um grande roedor inofensivo. Suas bochechas gordas e flácidas pareciam guardar comida, e os olhos cinza pálido saltavam timidamente de rosto em rosto, fugindo à pressa quando encontravam os de outrem.

A porta abriu-se e apareceu outro prisioneiro cujo aspeto deu um arrepio em Winston. Era um homem comum, de aparência medíocre, que poderia ser engenheiro ou técnico dalguma coisa. O que espantava era a magreza do seu rosto. Parecia uma caveira. Por causa da magreza, a boca e os olhos tinham ficado desproporcionais, e os olhos pareciam cheios de ódio homicida, incontrolável, a' alguém ou alguma coisa.

O homem sentou-se no banco a pequena distância de Winston. Ele não tornou a olhá-lo, porém enxergava a cabeça atormentada, escaveirada, como se a tivesse diante de si. De repente descobriu do que se tratava. O homem estava morrendo de fome. A mesma ideia deve ter ocorrido quase simultaneamente a todos na cela. Houve um ligeiro movimento no banco inteiro. Os olhos do homem sem queixo pousavam a medo no escaveirado e logo fugiam, como envergonhados; mas a atração era irresistível. Dali a pouco, começou a remexer-se no banco. Por fim levantou-se, atravessou a cela desajeitado, meteu a mão no bolso do macacão e, com ar embaraçado, estendeu um pedaço de pão sujo ao homem-caveira.

Houve um rugido furioso, ensurdecedor, da teletela. O sem queixo recuou num pulo. O homem-caveira escondera as mãos nas costas, como se a demonstrar ao mundo que recusava o presente.

- Bumstead! - rugiu a voz. - 2713 Bumstead J! Solta esse pedaço de pão!

O homem sem queixo derrubou o pão.





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