-Fica de pé onde estás - comandou a voz. - Olha para a porta. Não te mexas.
O homem obedeceu. As grandes bochechas flácidas tremiam sem controle. A porta abriu-se com estrépito. O jovem oficial entrou e afastou-se para o lado, dando passagem a um guarda baixo e atarracado com enormes braços e ombros. Postou-se diante do homem e então, a um sinal do oficial, vibrou tremendo murro na boca sem queixo. A força foi tamanha que a vítima pareceu voar. O corpo foi lançado do outro lado da cela, chocando-se na base da privada. Por um momento, ali ficou, o sangue escuro escorrendo da boca e do nariz. Um gemido muito débil, que parecia inconsciente, se fez ouvir. Depois rolou e levantou-se hesitante, apoiando-se nas mãos e joelhos. Numa torrente de sangue e saliva, caíram-lhe da boca as duas metades da dentadura.
Os presos deixaram-se ficar, imóveis, mãos postas nos joelhos. O homem sem queixo voltou para o seu lugar. De um lado, a carne do rosto estava escurecendo. A boca inchara, transformando-se numa massa informe, cor de cereja, com um orifício negro no meio. De vez em quando um pouco de sangue pingava no peito do macacão. Seus olhos cinzentos continuavam a saltar de face em face, mais culpados que nunca, como se tentasse descobrir até onde o desprezavam os outros, pela sua humilhação.
A porta abriu-se. Com um pequeno gesto o oficial indicou o homem de cara de caveira.
- Sala 101.
Ao lado de Winston houve uma exclamação e um movimento brusco. O homem atirara-se de joelhos ao chão, e erguia as mãos postas.
- Camarada! Oficial! - exclamou. - Não tens que me levar para aquele lugar. Já não te disse tudo? Que mais queres saber? Confessei tudo, não sobrou nada. Dize-me o que queres que eu confesso.