- E era comum - apenas repito o que li, nos livros de história - que essa gente e sua criadagem empurrassem os outros para a sargeta?
- Uma vez um cara me empurrou - disse o velho. - Me lembro como se fosse onte. Era a noite da Regata - ficavam levado da breca em noite de Regata - e eu bumba num rapaz na avenida Shaftesbury. Todo impelicado, o zinho - camisa de peito duro, cartola, sobretudo preto. Ia indo em zigue-zague pela calçada e eu esbarrei nele sem querer. Ele disse "Por que não olha para onde vai?" disse. E eu disse "Cê pensa que comprou o raio da calçada?" Ele disse "Eu te torço êsse pescoço duma figa se você se mete a sebo ... .. Cê tá bebo, já te mando prendê," eu disse. E o sr. não acredita, mas ele botô as mãos no meu peito e me deu um empurrão que quaji me atira debaixo das roda dum ônibu. Daí eu, uai, eu era moço, e ia lhe largá uma daquelas...
Uma espécie de desespero dominou Winston. A memória do velho não passava de um monturo de pormenores atoa. Poderia interrogá-lo o dia inteiro sem obter nenhum dado genuíno. De certo modo, as histórias do Partido talvez fossem verdadeiras: podiam até ser completamente verídicas. Fez a última tentativa.
- Talvez não me expliquei bem, - disse. - O que quero dizer é o seguinte. Vives há muito tempo. Viveste metade da vida antes da Revolução. Em 1925, por exemplo já eras adulto. Pelo que recordas, podes dizer que a vida em 1925 era melhor que agora, ou pior? Qual escolherias, quando preferias viver, naquela época ou agora? O homem fitou longamente o alvo das flechinhas. Terminou o chope, mais devagar que antes. Quando falou foi com um ar tolerante, filosófico, como se a cerveja o tivesse abrandado.