Madame Bovary - Cap. 29: VI Pág. 308 / 382

Emma esperou Léon três quartos de hora. Por fim correu ao cartório e, perdida em todas as espécies de conjecturas, acusando-o de indiferença e acusando-se a si mesma de fraqueza, passou toda a tarde com a testa colada à vidraça.

Às duas horas estavam ainda sentados à mesa, um defronte do outro.

A grande sala ia-se esvaziando; o cano do fogão, com a forma duma palmeira, espalhava no tecto a sua copa dourada; e, perto deles, atrás do envidraçado, em pleno sol, gorgolejava um pequeno repuxo num tanque de mármore, onde, entre espargos e agriões, se estendiam três lagostas entorpecidas junto de uma pilha de codornizes amarradas e deitadas de lado.

Homais todo se deleitava. Apesar de se embriagar ainda mais com o luxo do que com a pinga, o vinho de Pomard, entretanto, excitava-lhe um pouco as faculdades e, quando apareceu a omeleta de rum, fez uma exposição de teorias imorais acerca das mulheres. O que acima de tudo o seduzia era o chiquismo. Adorava uma toilette elegante numa casa bem mobilada e, quanto às qualidades físicas, não detestava um bom pedaço.

Léon olhava desesperado para o relógio. O boticário bebia, comia, falava.

- O senhor deve passar uma vida de privações aqui em Ruão - disparou Homais inesperadamente. - Ainda assim, os seus amores não residem muito longe.

E, como o outro corava, continuou:

- Ora seja franco! É capaz de negar que em Yonville... ? O rapaz balbuciou qualquer coisa.

- Em casa da Sr. Bovary, fazia a corte...?

-A quem?

-À criada!

Homais não gracejava; mas, como a vaidade lhe suplantava a prudência, Léon, mal-grado seu, não se conteve sem protestar. Além disso, só gostava de morenas.

- Nisso tem razão - disse o farmacêutico -, são muito mais ardorosas.

E, inclinando-se para o ouvido do amigo, indicou-lhe os sintomas pelos quais se reconhecia que uma mulher era ardorosa.





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