Cristãos e infiéis fizeram silêncio: era uma destas situações em que a voz expira na garganta; porque o viver parece quase paralisar-se.
E os árabes avançavam sempre, e os golpes das pesadas secures godas batiam roucos e cada vez mais violentos e repetidos nas raízes que estalavam, lascando; e já os olhos esverdeados de cólera, faiscantes, desvairados dos infiéis, cujas barbas negras varriam o tronco, se encontravam com o olhar torvo de Sanción, curvo, vibrando golpes sobre golpes, e cercado de alguns companheiros que o imitavam — aqueles a quem o consentia a apertura do sítio, enquanto os outros, com os franquisques nas mãos, se preparavam para repelir os inimigos, que só um a um poderiam transpor a estreita passagem.
Subitamente estouram as últimas fibras do lenho; a árvore monstruosa despenha-se da sua base de pedra, escapa da riba fronteira, tomba pelas pontas dos rochedos limosos, fá-las voar em rachas e bate sobre o dorso da torrente, cujo ruído não pôde devorar inteiramente o alarido dos infiéis precipitados, que deixam os fragmentos das armas, dos vestidos e dos membros pendentes dos bicos das rochas. As águas, espadanando, trepam em lençóis de escuma pelas paredes anfractuosas do precipício e lambem o sangue que por instantes as tingiu. Depois, o grosso madeiro flutua, deriva pela corrente e lá vai, de envolta com ela, em demanda das solidões do mar.
Os árabes que enchem o recinto das ruínas recuam diante de tão horroroso espectáculo: os godos enviam-lhes uma risada feroz de insulto e desaparecem na espessura das brenhas que se dilatam até as raízes da montanha de Auseba, onde deve ser o termo da sua viagem.