O Retrato de Ricardina - Cap. 5: CAPÍTULO V - MÃE E FILHA Pág. 28 / 178

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- Não teimo nada... Casar com o primo Carlos não posso. Com o Moniz não quer a mãe que eu case. Que hei de eu fazer? O pai determinou que eu fosse para o convento... vou.

- Mas, olha, filha, vai entretendo, pede mais algum tempo.

- Não sei para quê... Afinal, quanto mais tempo estiver a enganar o pai, mais ódio ele me ganha. O melhor é ir já. Levo muitas saudades da minha mãe e da minha Eugénia; hei de chorar muito; mas o que vale é que a minha vida tem de ser curta.

- Não é de nós que tu levas saudades... - invetivou a mãe com ingrato ânimo e sorriso amargo. - As tuas saudades ficam onde deixas o coração.

- Está enganada, minha mãe - balbuciou Ricardina. - Sou muito amiga de Bernardo; mas sou mais ainda da minha família. Se o não fosse... poderia dar algum passo que lhe causasse muita pena.

- Qual passo? - acudiu D. Clementina, como quem conhecia experimentalmente os passos usuais em lances análogos. - Que havias tu de fazer? Fugir?

A filha não respondeu às instâncias iradas da mãe.

- Fugir?, responde... Tu pensas que o Bernardo, se praticasse essa infâmia, vivia vinte e quatro horas? Não sabes o pai que tens, nem o filho do Silvestre da Fonte conhece Leonardo Botelho de Queirós! Matava-o, tão certo como dizer-to eu; e a ti, desgraçada, não sei se te seria melhor ter sorte igual à do homem que nos fizesse tamanha afronta! Então ele já te convidou a fugir? - exclamou D. Clementina com raivosos trejeitos.

- A mãe está fora de si! - atalhou amedrontada Ricardina. - Pois eu já lhe disse que queria fugir, ou que ele me...

- Então que querias dizer senão isso? - volveu a mãe já menos incendida. - Apre! que estou a suar! Fugir!

Faz-me horror esta palavra! Concentrou-se com amargurados sinais de dor profunda, a olhar fitamente nos olhos orvalhados da filha; e, à volta de alguns segundos, repetiu:

- Fugir!.





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