CAPÍTULO X - A SORTE O abade de Espinho, vencido o impulso de ir em pessoa a Coimbra, sem ter sobre o certo o destino da filha, pediu à justiça de Viseu providências e ordens de captura para o académico Bernardo Moniz, raptor de Ricardina Pimentel. O corregedor duvidou passar mandados de prisão sem certeza de ser réu aquele que o autor não indiciava com provas sequer diminutas.
O corregedor pertencia ao bando liberal: está explicada a hesitação, sabido que os três irmãos Monizes eram dos mais exaltados amigos da revolução, à qual o corregedor visiense devia a magistratura. Apesar disso, mandou devassar do estudante arguido, e colheu que Bernardo Moniz vivia, como sempre, em Coimbra com os seus irmãos e dois criados, sem companhia de senhora alguma, no caso da indigitada fugitiva do convento. juntava o magistrado de Coimbra que Bernardo frequentava os bancos escolares assiduamente, e das aulas ia para casa, onde procedia como estudioso exemplar de académicos melhormente morigerados.
O padre Botelho de Queirós, tendo ouvido ler a resposta à deprecada, irrompeu em diatribes contra os dois magistrados, taxando-os de desprezadores da honra das famílias, razão de serem inimigos do altar e do trono - malhados enfim. Repelido severamente pelo corregedor, bramiu:
- Se o Sr. D. Miguel não vier cedo fazer-me justiça, eu a farei pelas minhas mãos.
- Há carrascos legais, Sr. Abade... - atalhou o magistrado. - O Sr. D. Miguel, se voltar ao trono absoluto, estou que os patíbulos serão tantos que será preciso, Vossa Senhoria, funcionar...
- O Sr. Corregedor... - contrariou o padre com sangue de Queiroses aferventado nas artérias palpitantes.
- Que quer dizer?
- Que, se estivesse fora deste tribunal, levava duas bofetadas.