Madame Bovary - Cap. 25: II Pág. 277 / 382

Ouviram no vestíbulo o ruído seco de um pau batendo no soalho. Era Hippolyte, que trazia as bagagens da senhora. Para as pousar no chão, teve de descrever penosamente Um quarto de círculo com a sua perna postiça. «Já nem pensa naquilo!», dizia Emma para consigo, olhando o pobre diabo, cujo áspero cabelo ruivo escorria suor.

Bovary procurava uma moedazita no fundo da sua bolsa; e, sem parecer compreender toda a humilhação que para ele representava a simples presença ali daquele homem, como a acusação personificada da sua incurável inépcia, disse:

- Oh! tens um lindo ramalhete! - disse, vendo em cima do fogão as violetas de Léon.

- É - disse ela com indiferença. - Foi um ramalhete que comprei há pouco a uma mendiga.

Charles pegou nas violetas e, refrescando com elas os olhos vermelhos das lágrimas, cheirou-as delicadamente. Emma retirou-lhas logo da mão e foi colocá-las num copo com água.

No dia seguinte chegou a viúva Bovary. Choraram muito, ela e o filho.

Emma desapareceu, a pretexto de ter de dar ordens.

No outro dia foi preciso tratar em conjunto dos assuntos do luto. Foram sentar-se à beira da água, debaixo do caramanchão, com as suas caixas de costura.

Charles pensava no pai e admirava-se de sentir tanta afeição por aquele homem a quem, até então, lhe parecia ter amado apenas muito mediocremente. A mãe pensava no marido. Os piores dias passados na companhia dele pareciam-lhe agora invejáveis. Tudo se esvaía sob a instintiva saudade de um hábito tão prolongado; e, de vez em quando, ao mesmo tempo que fazia trabalhar a agulha, descia-lhe uma grande lágrima ao longo do nariz e aí ficava um momento suspensa. Emma pensava que, menos de quarenta e oito horas antes, estavam os dois juntos, longe do mundo, em completa embriaguez, não tendo olhos bastantes para se contemplarem um ao outro.





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