Madame Bovary - Cap. 29: VI Pág. 314 / 382

Depois, batendo com os tamancos sobre o sobrado da loja, subiu na frente da senhora ao primeiro andar e mandou-a entrar para um acanhado gabinete onde, em cima duma enorme secretária de madeira tosca, havia vários livros de escrituração, protegidos transversalmente por uma barra de ferro presa com um cadeado. Encostado à parede, encoberto por retalhos de cassa, entrevia-se um cofre-forte, mas com tais dimensões que devia conter outras coisas além de notas e moedas. O Sr. Lheureux, com efeito, emprestava dinheiro sobre penhoras, e era ali que havia guardado a corrente de ouro da Se Bovary, juntamente com os brincos do pobre Tio Tellier, que, constrangido, por fim, a vender, havia comprado em Quincampoix um magro negócio de mercearia, onde definhava com o seu catarro, no meio das suas velas, menos pálidas do que a cor do seu rosto.

Lheureux sentou-se na grande cadeira de vime, dizendo:

- O que há de novo?

-Veja.

E mostrou-lhe o papel.

- Muito bem, e que posso eu fazer?

Então ela enfureceu-se, lembrando-lhe a palavra que ele tinha dado de não fazer circular as suas -letras; ele concordou:

- Mas fui obrigado a isso, pois estava com a corda na garganta.

- E agora, o que vai acontecer? - continuou ela.

- Oh! É muito simples: um julgamento no tribunal e depois a penhora...; ora bolas!

Emma teve de se conter para não lhe bater. Perguntou-lhe mansamente se não haveria modo de acalmar o Sr. Vinçart.

- Era bom que houvesse! Acalmar o Sr. Vinçart; bem e vê que não sabe quem é ele; mais feroz do que um árabe.

De qualquer modo, era preciso que o Sr. Lheureux interviesse no assunto.

- Escute lá! Parece-me que, até ao presente, tenho sido bastante correcto com a senhora.

E, abrindo um dos seus livros:

- Repare!

Depois, percorrendo a página com o dedo:

- Ora vejamos.





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