Madame Bovary - Cap. 4: IV Pág. 33 / 382

Os que ficaram nos Bertaux passaram a noite a beber na cozinha. As crianças deixaram-se dormir debaixo dos bancos.

A noiva suplicara ao pai que a poupassem às habituais partidas. Apesar disso, um primo, vendedor de peixe (que, por sinal, como presente de casamento, lhe trouxera um par de linguados), começava já a soprar água com a boca pelo buraco da fechadura, quando o Tio Rouault chegou mesmo na altura de o impedir, explicando-lhe que a distinta posição do genro não permitia tais inconveniências. O primo, no entanto, teve dificuldade em aceitar as razões. No íntimo, ficou a acusar o Tio Rouault de ser orgulhoso e foi juntar-se num canto a quatro ou cinco outros convidados que, tendo por acaso recebido na mesa, várias vezes seguidas, os piores bocados de carne, também achavam que haviam sido mal recebidos e murmuravam acerca do anfitrião, dando a entender que lhe desejavam a ruína.

A Sr. Bovary mãe não abrira a boca durante todo o dia. Não fora consultada sobre o vestido da noiva nem sobre o programa da festa; recolheu-se cedo. O marido, em vez de a acompanhar, mandou buscar charutos a Saint- Vicror e fumou até amanhecer, bebendo grandes grogues de kirsch, mistura desconhecida dos convivas, o que foi motivo para que lhes merecesse ainda uma maior consideração.

Charles não era nada dado a apreciar divertimentos e não brilhou durante a boda. Respondeu mediocremente às piadas, aos trocadilhos, às insinuações, às felicitações e gracejos que todos se achavam na obrigação de lhe dirigir logo a partir da sopa.

No dia seguinte, em contrapartida, parecia outro homem. Era ele que poderia ser tomado como a virgem da véspera, enquanto a recém-casada nada deixava descobrir por onde se pudesse adivinhar qualquer coisa.





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