Madame Bovary - Cap. 34: XI Pág. 379 / 382

Charles consentiu. Mas, no momento da despedida, faltou-lhe toda a coragem. Deu-se então a rotura completa e definitiva.

À medida que ia perdendo as suas afeições, mais estreitamente se apegava ao amor da filha. Ela causava-lhe entretanto preocupações, porque tossia algumas vezes e tinha rosetas muito vivas nas faces.

Defronte dele ostentava-se, florescente e hilariante, a família do farmacêutico, que tudo na vida contribuía para satisfazer. Napoléon ajudava-o no laboratório, Athalie bordava-lhe um boné, Irmã recortava rodelas de papel para cobrir as compotas e Franklin recitava, de um fôlego só, a tábua de Pitágoras. Homais era o mais feliz dos pais, o mais afortunado dos homens.

Engano! Andava minado por uma ambição surda: queria ter uma condecoração. Títulos não lhe faltavam:

1.° Ter-se evidenciado, por ocasião da cólera, por uma dedicação sem limites; 2.° Ter publicado, e a expensas próprias, diferentes obras de utilidade pública, tais como... (E recordava a sua memória intitulada: Da Sidra, do Seu Fabrico e dos Seus Efeitos; além disso as observações sobre o pulgão lanígero, enviadas à Academia; o seu volume de estatística, e até a sua tese de Farmácia); sem contar que era membro de várias sociedades científicas (era-o apenas de uma).

- Finalmente - exclamava ele, fazendo uma pirueta -, quanto mais não fosse, por me ter evidenciado nos incêndios!

Então Homais começou a inclinar-se para o poder. Prestou secretamente ao prefeito grandes serviços durante as eleições. Vendeu-se por fim, deixou-se corromper. Chegou a dirigir ao soberano uma petição em que lhe suplicava que lhe fizesse justiça; chamava-lhe nosso bom rei e comparava-o a Henrique IV.

E todas as manhãs o boticário se lançava sobre o jornal para nele descobrir a sua nomeação; e ela não vinha.





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