Um dia em que fora ao mercado de Argueil para vender o cavalo - seu último recurso - encontrou Rodolphe.
Empalideceram quando se avistaram. Rodolphe, que apenas mandara um cartão, começou por balbuciar algumas desculpas, depois ganhou confiança e levou a ousadia até ao ponto de o convidar a beber uma cerveja no botequim (estava-se no mês de Agosto e fazia muito calor).
Sentado em frente dele, mordia o charuto enquanto conversava e Charles perdia-se em cogitações diante daquela fisionornia que Emma amara. Parecia-lhe tornar a ver qualquer coisa dela. Era uma espécie de encantamento. Quisera ele ser aquele homem.
O outro continuava a falar de agricultura, de gado, de adubos; preenchendo com frases banais quaisquer pausas que pudessem dar lugar a alguma alusão. Charles não o estava a escutar; Rodolphe apercebeu-se disso e seguiu, nos movimentos fisionómicos dele, a passagem das recordações. Charles ia ficando gradualmente mais enrubescido, as narinas palpitavam-lhe rapidamente, os lábios tremiam-lhe; houve mesmo um instante em que ele, possuído duma fúria tenebrosa, fixou os olhos em Rodolphe, que, sentindo uma espécie de pavor, se interrompeu. Mas logo lhe reapareceu no rosto a mesma prostração fúnebre.
- Não lhe desejo mal- disse então.
Rodolphe emudecera. E Charles, com a cabeça apoiada nas mãos, repetiu com uma voz sumida e no tom resignado das dores infinitas:
- Não, já não lhe desejo mal!
Acrescentou mesmo uma grande frase, a única que jamais dissera:
- Foi culpa da fatalidade!
Rodolphe, que manobrara aquela fatalidade, achou-a demasiado indulgente, cómica mesmo e um tanto vil na boca dum homem que se encontrava naquela situação.