Madame Bovary - Cap. 1: PRIMEIRA PARTE – I Pág. 6 / 382

Mandava-o ir deitar-se às escuras, ensinava-o a beber grandes doses de rum e a insultar as procissões. Mas, como era por natureza pacífico, o miúdo correspondia mal aos seus esforços. A mãe andava sempre com ele agarrado às saías; recortava-lhe cartões, contava-lhe histórias, entretinha-se com ele em monólogos sem fim, cheios de gracinhas melancólicas e de tagarelices mimalhas. No isolamento da sua vida, ela meteu naquela cabeça de criança todas as vaidades esparsas, desfeitas. Sonhava com altas posições, via-o já crescido, belo, espirituoso, bem estabelecido, como engenheiro ou magistrado. Ensinou-o a ler e, com a ajuda de um velho piano que tinha, até o ensinou a cantar duas ou três romanças. Mas, a tudo isto, o Sr. Bovary, pouco preocupado com as letras, dizia que não valia a pena! Teriam eles alguma vez meios para o manter nas escolas do Governo, para lhe comprar um cargo ou montar-lhe um negócio? Além disso, um homem desembaraçado triunfa sempre na vida. A Sr. Bovary mordia os lábios e o filho vagabundeava pela aldeia.

Ele seguia os trabalhadores e fazia voar os corvos, atirando-lhes grandes torrões. Comia amoras pelos valados guardava os perus com uma vara, espalhava o trigo para secar, corria pelo bosque, brincava debaixo do pórtico da igreja nos dias de chuva e, nos dias de festa, pedia ao sacristão que o deixasse tocar os sinos, para se pendurar com todo o peso na grande corda e sentir-se elevado por ela no seu vaivém.

Por isso foi crescendo como um carvalho. Adquiriu mãos robustas e cores saudáveis.

Aos doze anos, a mãe conseguiu que começassem os seus estudos. Foi encarregado disso o padre-cura. Mas as lições eram tão breves e com tantas interrupções que de pouco serviam. Eram dadas nas horas vagas na sacristia, de pé, à pressa, entre um baptismo e um enterro; ou então o cura mandava chamar o seu aluno depois das ave-rnarias, quando já não tinha de sair.





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