Madame Bovary - Cap. 8: VIII Pág. 62 / 382

A noite estava escura. Caíam algumas gotas de chuva. Aspirou o vento húmido que lhe refrescava as pálpebras. A música do baile ainda lhe ressoava aos ouvidos e esforçava-se por se manter acordada, a fim de prolongar a ilusão daquela vida luxuosa que há momentos fora obrigada a abandonar.

Começou a amanhecer. Ela olhou demoradamente para as janelas do palácio, procurando adivinhar quais seriam os quartos de todos aqueles em quem reparara na véspera. Quisera conhecer-lhes a existência, penetrá-la, confundir-se com ela.

Mas tremia de frio. Despiu-se e encolheu-se entre os lençóis, encostando-se a Charles que dormia.

Ao almoço havia muita gente. A refeição demorou dez minutos; não serviram nenhum álcool, o que causou admiração ao médico. Em seguida, a Menina de AnderviUers apanhou os bocadinhos de bolo para uma cestinha, para os ir levar aos cisnes do tanque, e foi-se dar um passeio pela estufa, onde plantas extravagantes, eriçadas de pêlos, se sobrepunham em pirâmides sob vasos suspensos, que, semelhantes a ninhos de serpentes a transbordar, deixavam cair pelas bordas longos cordões verdes entrelaçados. O laranjal, que se encontrava no extremo, cobria o caminho até às dependências do palácio. O marquês, para distrair Emma, levou-a a ver as cavalariças. Por cima das manjedouras, em forma de cestos, havia placas de porcelana com os nomes dos cavalos em letras pretas. Cada animal se agitava no seu estábulo quando se lhe passava próximo, dando estalos com a língua. O soalho da arrecadação estava limpo e polido como o de uma sala. Os arreios de carruagem estavam pendurados ao centro, sobre duas colunas giratórias, e os freios, os chicotes, os estribos e as barbelas enfileirados ao longo da parede.

Charles, entretanto, foi pedir a um criado que lhe aparelhasse o carro.





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