- O uso - respondeu-lhe o alto dignitário - é abraçar o rei e beijá-lo nas duas faces.
Cândido e Cacambo saltaram ao pescoço de Sua Majestade, que os recebeu com uma amabilidade extraordinária e os convidou delicadamente para jantar.
Entretanto, mostraram-lhes a cidade, os edifícios públicos, que chegavam até às nuvens, as praças, ornadas de mil colunas, as fontes de água pura, água cor-de-rosa e licores de cana-de-açúcar, que corriam constantemente nas grandes praças, pavimentadas por uma espécie de pedrarias que exalavam um odor semelhante ao do cravinho e da canela. Cândido pediu para ver o Palácio de Justiça e o Supremo Tribunal. Disseram-lhe que não existiam, no Eldorado não havia pleitos. Perguntou se havia prisões e disseram-lhe que não. O que mais o surpreendeu e maior prazer lhe deu foi o Palácio das Ciências, onde viu uma galeria de dois mil passos, cheia de instrumentos de matemática e de física.
Depois de terem percorrido cerca da milésima parte da cidade, reconduziram-nos ao palácio. Cândido sentou-se à mesa entre Sua Majestade, o seu criado Cacambo e algumas damas. Nunca tinham comido banquete tão excelente e jamais tinham ouvido alguém com tanto espírito como Sua Majestade. Cacambo explicava a Cândido os ditos do rei, que, apesar de traduzidos, mesmo assim eram preciosos. De tudo o que o admirou, não foi isso o que menos o espantou.
Passaram um mês neste hospício. Cândido não se cansava de dizer a Cacambo:
- É verdade, meu amigo, mais uma vez afirmarei que o castelo em que nasci não vale o país em que nos encontramos, mas a verdade é que a menina Cunegundes não está aqui e vós tendes, sem dúvida alguma, amante na Europa. Se ficarmos aqui, seremos apenas homens como os outros, ao passo que, se voltarmos ao nosso mundo, mesmo que levemos unicamente uma dúzia de carneiros carregados de pedras do Eldorado, seremos mais ricos que todos os reis juntos.