Eurico, o Presbítero - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 168 / 186

Hermengarda contemplava-o com assombro e terror... Como o entenderia ela? Eurico prosseguiu:

— Olha tu! Ao pôr do Sol, no Estio, ia eu assentar-me sobre um cerro marítimo, alongando a vista pelo oceano tranquilo, e parecia- -me divisar-te desenhada na atmosfera, a sorrir-me. Então, as lágrimas de felicidade começavam a brotar-me dos olhos: depois, lembrava-me de quem eu era, e essas lágrimas condensavam-se a meio das faces e queimavam como se fossem metal candente. A horas mortas, correndo pelos desvios, quando o vento açoutava os arbustos enfezados da montanha, cada sombra que se meneava ao luar, sobre o chão pardacento, era a tua sombra que eu via. Outras noites, em que mais tranquilo podia, a sós comigo, engolfar-me nos pensamentos de Deus, a tua imagem vinha interpor-se entre mim e a lâmpada mortiça que me alumiava, e o hino do presbítero de Carteia, que devia, talvez, escrever-se nos hinários das catedrais da Espanha, ficava incompleto ou terminava por uma blasfémia; porque também te via sorrir, mas a outrem, mas a homem feliz com o teu amor, e eu tinha então sede... sede de sangue... Era uma lenta agonia! E sempre tu ante mim: nas solidões das brenhas, na imensidade das águas, no silêncio do presbitério, nos raios esplêndidos do Sol, no reflexo pálido da Lua e, até, na hóstia do sacrifício... sempre tu!... e sempre para mim impossível!

— Mas deliras!.. — interrompeu Hermengarda. — Que tens tu com o presbítero de Carteia; com esse ilustre sacerdote, cujos hinos sacros reboavam ainda há pouco pelos templos da Espanha, e a quem, decerto, o ferro ímpio dos árabes não respeitou!? A tua glória é outra e mais bela; a glória de seres o vencedor dos vencedores da Cruz. A sua era santa e pacífica. Deus chamou-o para si, e tu vives para ser meu. Ninguém existe hoje no mundo que possa embaraçá-lo. Esquece o passado; esquece-o por amor de mim! O cavaleiro sorriu de novo dolorosamente, e disse-lhe:





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