— Ei-lo que vem! ei-lo, o cavaleiro negro!
Mas, porque parou ele, sofreando subitamente o ginete? Que há aí, nessa extensa seara ceifada de homens de guerra, que possa atrair os olhos do mais incansável dos seguidores? No sítio em que parou estava, poucas horas antes, hasteada a signa real: era o centro da hoste goda; mas dos que aí pelejavam, uns lá vão ao longe precipitar-se no abismo da ignomínia; outros, os mais felizes, adormeceram do seu último sono no regaço da pátria. O guerreiro fitou os olhos no chão: a foice da morte, passando por ali, cerceara a derradeira esperança do império de Teodorico. O espectáculo que se lhe antolhava era a explicação do terror que se apossara de tantos homens valentes. Fugiam: Roderico, porém, estava aí!, mas retalhado de golpes; mas sem vida! Já não seria debaixo de seus pés que o trono da Espanha se desfaria aos golpes do machado dos árabes. Um ceptro sem dono em Toletum e mais um cadáver junto às margens do Chrysus, eis o que restava do último rei dos Godos! Com a sua morte fenecera ao redor dele a esperança, e com a esperança dera em terra o esforço dos ânimos mais robustos. As alas ignoravam este triste acontecimento e por isso pelejavam ainda.
Mas pouco tardou a ser geral a rota; porque pouco tardou a espalhar-se aquela nova fatal. Um dia bastara para aniquilar o império que durante quatro séculos fora o mais poderoso e civilizado entre as nações germânicas estabelecidas nas diversas províncias romanas. A corrupção dos últimos tempos concluíra a sua obra, e o edifício da monarquia gótica, ainda rico de majestade exterior, mostrara, enfim, desconjuntando-se e desabando, o ferver dos vermes que interiormente o roíam. A Cruz, derribada com ele, só devia tornar a hastear-se triunfante em todos os ângulos da Espanha depois do combater de oito séculos.