Eurico, o Presbítero - Cap. 11: Capítulo 11 Pág. 70 / 186

Uma parte do exército godo ainda pudera salvar-se atravessando o rio; mas as pontes lançadas na véspera tinham por fim estalado, derivando pela corrente, debaixo do peso dos fugitivos, e as águas devoravam muitos que o ferro havia poupado. Teodemiro, que não perdera o ânimo no meio daquela desventura, alcançara fazer passar à margem oposta as relíquias dos soldados da Bética e os restos de muitas tiufadias de outras províncias. Nos arraiais, os árabes, senhores do campo, saudavam a vitória com o som dos instrumentos bárbaros e com clamores de alegria que iam sussurrar longe pelos vales e campos, desertos dos seus moradores. Um homem só combatia ainda daquele lado à beira do rio. Era o cavaleiro negro. Cercavam-no muitos sarracenos, mas de longe, porque os que ousavam aproximar-se dele caíam a seus pés moribundos.

Às vezes, como que tentava romper por entre os inimigos, mas era tentar o impossível. No volver dos olhos inquietos para um e para outro lado, parecia buscar descobrir alguma cousa naquele vasto campo onde só descortinava cadáveres dos vencidos e os vultos ferozes dos vencedores. Por fim, voltando o rosto para a margem oposta, viu flutuar sobre uma eminência o pendão de Teodemiro. Uma expressão fugitiva de contentamento lhe assomou então ao gesto. Despedindo das mãos a borda ensanguentada, que sibilou por meio dos árabes apinhados em volta, o guerreiro arrojou-se à torrente. À luz do Sol que se punha, viu-se-lhe umas poucas de vezes reluzir o elmo, alongando-se pela superfície das águas e desaparecendo por largos espaços. As trevas, que já desciam densas, e a impetuosidade da corrente que o arrastava não permitiram prever- -se qual seria a sua sorte. Eurico era a última e tenuíssima esperança que bruxuleava nos horizontes do Império Godo: como estrela cadente que se imerge nos mares, aquele esforço brilhante se desvanecera na escuridão que tingia as águas do Chrysus!





Os capítulos deste livro