Mesmo dormindo não podia fugir-lhe à imagem. Não tocou o diário. Se alívio havia, estava no trabalho, no qual às vezes podia se esquecer do mundo por períodos de até dez minutos. Não tinha a menor ideia do que teria acontecido com ela. Não havia jeito de informar-se. Poderia ter sido vaporizada, poderia ter-se suicidado, poderia ter sido transferida a outra parte da Oceania: o pior, e mais provável, era que tivesse simplesmente mudado de ideia, e resolvido evitá-lo.
No dia seguinte ela reapareceu. Já não tinha o braço na tipoia, porém o pulso ainda estava enrolado em esparadrapo. O consolo de revê-la foi tamanho que não pôde resistir à tentação de fitá-la durante vários segundos. No dia seguinte, quase conseguiu falar-lhe. Ao entrar na cantina, ela já estava junto duma mesa, longe da parede, e sozinha. Era cedo, e a sala não estava cheia. A fila avançou vagarosa até Winston quase chegar ao balcão. Nesse momento deteve-se uns dois minutos porque alguém se queixava de não ter recebido sua pastilha de sacarina. Mas a jovem ainda estava só quando Winston tomou a bandeja e se encaminhou para a mesa. Ia caminhando com naturalidade, fingindo procurar lugar mais adiante. Estava a três metros dela, talvez. Mais dois segundos e pronto. Então uma voz atrás dele chamou "Smith!" Ele fingiu não ouvir. "Smith!" repetiu mais alto. Inútil. Voltou-se. Um moço louro, cara de bobo, chamado Wilsher, que ele mal conhecia, convidava-o, com um sorriso, a sentar-se à sua mesa. Não era seguro recusar. Tendo sido reconhecido, não podia preferir a mesa da moça sozinha. Daria na vista. Sentou-se com um sorriso amável.
O rosto louro e tolo correspondeu. Winston teve uma alucinação em que se via dando uma machadada bem no meio daquele sorriso alvar.