Os berros mais selvagens eram os dos escolares. Havia uns vinte minutos que falava quando um mensageiro subiu à plataforma e um pedaço de papel foi passado às mãos do demagogo. Ele desenrolou-o sem parar; nada se alterou na sua voz, nem nos gestos, nem no conteúdo do que dizia. Mas de repente mudaram os nomes. Sem que uma palavra fosse pronunciada nesse sentido, uma onda de compreensão percorreu a massa. A Oceania estava em guerra com a Lestásia! No momento seguinte houve uma tremenda comoção. As faixas, bandeiras e cartazes que adornavam a praça estavam todos errados! Cerca da metade ostentava caras erradas! Era sabotagem! Os agentes de Goldstein tinham agido! Houve um ruidoso interlúdio durante o qual os cartazes foram arrancados das paredes, as bandeiras rasgadas e pisadas. Os Espiões executaram proezas admiráveis, marinhando sobre os telhados e cortando as faixas presas às chaminés. Dentro de um minuto ou dois tudo acabou. O orador, ainda agarrado ao microfone, ombros arcados para frente, a mão enorme ainda ameaçando, continuara o discurso. Dali a um minuto, os urros de féra da multidão furiosa de novo rasgaram os ares. O ódio continuou exatamente como antes. Apenas o alvo fora mudado.
Em retrospetiva, o que impressionara Winston, fora ter o orador passado de um inimigo a outro no meio da frase, não apenas sem pausa: sem a menor ofensa à sintaxe. Mas, no momento, tivera outras coisas a preocupá-lo. Fora no momento exato das desordens que um homem, cujo rosto não pôde ver, lhe deu um tapinha no ombro e disse: "Desculpe, acho que derrubaste tua pasta." , E Winston a tomara distraído, sem falar. Sabia que alguns dias se passariam, sem oportunidade de abri-la. No instante em que a demonstração acabara, fora direto ao Ministério da Verdade, embora já fosse quase vinte e três horas.