A coisa que agora impressionava Winston de repente era que a morte de sua mãe, quase trinta anos atrás, fora trágica e tristonha, de um modo que não seria mais possível.Ele percebia que a tragédia pertencia ao tempo antigo, a uma época em que havia ainda vida privada, amor e amizade, e em que os membros duma família amparavam uns aos outros sem indagar razões. A lembrança de sua mãe magoava-lhe o coração porque ela morrera amando-o, numa época em que ele era criança e egoísta demais para corresponder-lhe e porque, de certo modo, que ele não recordava, ela se sacrificara a uma conceção de lealdade particular e inalterável. Ele via que tais coisas não mais podiam acontecer. Hoje o que havia era medo, ódio, dor, porém nenhuma dignidade de emoção, nenhuma mágoa profunda ou complexa. Tudo isto lhe pareceu ver nos grandes olhos de sua mãe e sua irmã, olhando-o através da água verde em que afundavam, centenas de braças abaixo donde ele estava.
De repente encontrou-se num relvado fofo e curto, numa noite estival, em que os raios oblíquos do sol ainda douravam o chão. A paisagem que contemplava aparecia tanto em seus sonhos que nunca podia ter certeza de a ter visto ou não no mundo real. Desperto, chamava-a de Terra Dourada. Era um velho pasto estragado pelos coelhos, com uma picada que serpeava de um lado a outro, e pontilhado de cupins. Na sebe maltratada, do outro lado do campo, os ramos dos ulmeiros balouçavam de leve na brisa, e suas folhas palpitavam em densas massas, como cabelo de mulher. Por ali perto, embora invisível, havia um regato límpido e lento, em que nadavam os mugens, nos espraiados à sombra dos chorões.
A moça do cabelo escuro vinha ao encontro dele, atravessando o campo.