Eram de folha fina, horrorosas, mas era dificílimo arranjar panelas. O estoque não durara muito, portanto. As mulheres que tinham conseguido comprar tentavam se afastar com as caçarolas em punho, pisadas e acotoveladas pelo resto, enquanto dúzias de outras clamavam, em torno da barraca, acusando o feirante de favoritismo e de ter mais caçarolas escondidas. Houve nova série de uivos. Duas mulheres gordalhufas, uma delas com o cabelo caindo sobre os olhos, tinham agarrado a mesma caçarola e estavam tentando se apossar dela. Por um momento, houve empate. Depois o cabo se desprendeu. Winston observou-as enojado. E no entanto, por um momento, que poderio aterrorizante se fizera ouvir naquele grito de algumas centenas de gargantas! Por que não poderiam gritar dessa forma quando acontecesse algo de fato importante?
Escreveu: Não se revoltarão enquanto não se tornarem conscientes, e não se tornarão conscientes enquanto não se rebelarem.
Refletiu que a frase poderia ser quase a transposição de um dos textos básicos do Partido. O Partido proclamava, naturalmente, ter libertado os proles da servidão. Antes da Revolução eram oprimidos pelos capitalistas, tinham sido chicoteados e submetidos à fome, as mulheres forçadas a trabalhar nas minas de carvão (na verdade, as mulheres ainda trabalhavam nas minas), as crianças vendidas às fábricas com a idade de seis anos. Simultaneamente, fiel aos princípios do duplipensar, o Partido ensinara que os proles eram naturalmente inferiores, que deviam ficar em sujeição, como animais, pela aplicação de algumas regras simples. Pouquíssimo se sabia a respeito dos proles. Não era necessário saber muito. Contanto que continuassem a trabalhar e se reproduzir, não tinham importância suas outras atividades.